Contra o atraso das noivas, padre veta casamentos à noite

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Patrícia Maniero e Evandro Lima, que se casaram de manhã; atraso de noivas faz padres vetarem cerimônias à noite
Patrícia Maniero e Evandro Lima, que se casaram de manhã; atraso de noivas faz padres vetarem cerimônias à noite

No dia 9 de novembro, a secretária Patrícia Maniero, 25, realizará um sonho que cultiva há nove anos. Vai se casar com o coordenador mecânico Evandro Lima, 27.

A vontade de subir ao altar, no entanto, não será a mesma que ela alimenta desde a infância: casar-se na Igreja Matriz de Batatais –com o maior acervo sacro do pintor Cândido Portinari.

A proibição dos casamentos aos sábados à noite, decidida pelo padre, acabou com a esperança de outras noivas.

O padre Pedro Bartolomeu diz que as noivas se atrasam muito e que passaram a usar o casamento como um evento social, e não religioso. Agora, para casar à noite só se for às sextas-feiras. Aos sábados, só pode até as 17h.

“Depois que o padre resolveu proibir, mudei para a igreja do meu bairro. O padre disse que os casamentos lá são só para promover festa.”

A prática vigora também em igrejas de Ribeirão Preto e na igreja Matriz de Brodowski, terra natal de Portinari e vizinha a Batatais.

 

‘SHOW DA XUXA’

“O meu ideal, enquanto padre, é salvar almas e não apenas satisfazer o ego de noivos”, disse Bartolomeu. Ele também opina na decoração. “Uma vez tinha gelo seco e canhões de luz coloridos na porta da igreja. Me senti no show da Xuxa, em um evento teatral”, afirma.

São exageros que o pároco credita ao fato de as pessoas procurarem a igreja “pela beleza do prédio e não pelo interesse sacramental”.

Segundo Bartolomeu, o veto aos casamentos noturnos é adotado desde 2012 –data questionada por noivas. A empresária Renata Rodrigues, que se casou em 8 de dezembro –um sábado–, diz que a cerimônia foi à noite.

“Foi no curso de noivos que frequentei que o padre Pedro deu a notícia da proibição”, afirmou.

Bartolomeu afirma que a procura por casamentos caiu após o veto. “Concluímos que estavam vindo casar por beleza, por luxo e por status, não pelo sacramento.”

O padre Nelci Souza, da igreja de Santa Rita de Cássia, também em Batatais, apoia a decisão do colega. “O pároco determina o que deve fazer dentro de seu território paroquial”, disse.

Questionada se havia alguma paróquia com regra semelhante, a diocese de São Carlos, que tem 104 paróquias, informou desconhecer. “A grande maioria dos matrimônios é celebrada no período noturno”, afirma Stéfano Fachina, secretário da Cúria Diocesana. “Seria um absurdo suspendê-los.”

Padres dizem que tradição do atraso tem que acabar

Lê-se no “Novo Manual Matrimonial”, que a professora de etiqueta Susanne Amandi escreveu em 1961: “A tradição pede: convidados, família e noivo devem estar na igreja há uma hora, antes que a noiva chegue”.

Parece que as páginas do (nem tão novo) manual de casamentos amarelaram com o passar do tempo.

Celebrantes estão em pé de guerra com a tradição do atraso, que ainda é amplamente vista como aceitável.

Párocos interioranos baniram cerimônias noturnas. Não se ouve falar de situação parecida em São Paulo –pelo contrário, elas só crescem, se multiplicam e ajudam a sustentar as naves.

Ainda assim, há na capital paulistana um movimento para matar o hábito, que agora faz mal aos negócios.

Para acertar os ponteiros, padres (e alguns pastores, rabinos e xás) adotaram a lógica do psicoterapeuta: o “cliente” atrasou, perdeu parte da celebração, que fica estritamente dentro do horário combinado.

As duas empreitadas vêm para rasgar essa etiqueta, que resta de uma época em que casamento era mais rito religioso do que festa.

Idos em que templos não funcionavam no esquema “altar quente” de hoje: as igrejas mais procuradas realizam duas (às vezes três) uniões em uma só noite.

“É o dia mais importante da minha vida” é frase tão comum em boca de noiva quanto “Sim, eu aceito”.

O problema é convencer um casal de que dois eventos mais especiais de uma vida ocupam o mesmo lugar no espaço, com apenas segundos de distância entre uma cerimônia e outra. Uma tarefa para quem tem a fé (e a paciência) de um padre.

Folha | Portal Padom

 

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