Reduto do papa em periferia tem assédio de igrejas evangélicas

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Papa Francisco IRegiões onde o agora papa Francisco mais exerceu suas atividades pastorais, os bairros pobres e periféricos das cidades argentinas têm cedido cada vez mais espaço às igrejas evangélicas, em detrimento do catolicismo.

Marta Alicia Estigarribia, de 42 anos, frequentava a Igreja Católica seguindo o caminho dos pais. Em 1989, vivia uma crise econômica tão profunda que planejou pôr fim à própria vida, incendiando a casa. Já tinha provocado um vazamento de gás quando ouviu palmas de visitas à porta da sua casa em Posadas, fronteira com o Brasil.

Eram representantes da Igreja Crente evangélica que traziam a palavra de Deus e a convidavam a um culto.

“Surgiram do nada. Para mim, foi como um milagre de Deus. Fui ao culto na mesma hora e a minha vida começou a mudar”, recorda.

Marta mudou-se para a favela Villa 31, em Buenos Aires, há seis meses. Mãe de 12 filhos, começou a frequentar lá a Universal, na mesma semana em que Jorge Bergoglio tornou-se o papa Francisco.

“Na igreja evangélica, passei a ter uma relação direta com Deus. Na católica, o padre reza a missa e pronto. Na evangélica, senta-se para conversar e, se for preciso, vai até a sua casa para saber o que acontece”, compara.

 

Nos últimos 52 anos, 14% dos católicos migraram para outros cultos, principalmente o evangélico, particularmente em áreas empobrecidas, segundo o último estudo do Conicet (Conselho Nacional de Investigações Científicas e Técnicas), de 2008.

O trabalho aponta que 9 de cada 10 argentinos disseram acreditar em Deus. Do total, 76,5% consideram-se católicos e 9% se disseram evangélicos; 23,8% afirmaram ser praticantes e 76% dos argentinos confessaram praticar pouco ou nunca.

Nos últimos 20 anos, a fuga de católicos foi constante, embora menor do que se esperava. Eram 2.716 cultos em 1999; hoje, são 3.634, segundo dados oficiais.

O número de centros evangélicos já superou o de igrejas católicas. São 15 mil tempos evangélicos, com 5 milhões de seguidores. Pelo lado do catolicismo, são 11,5 mil paróquias, igrejas, capelas e santuários.

Na favela Villa 31, uma filial da Igreja Universal fica a apenas 30 metros da capela onde Bergoglio vinha pelo menos uma vez por ano para tomar a comunhão.

O agora papa Francisco saía da Catedral Metropolitana, atravessava o centro de Buenos Aires e chegava à capela Nossa Senhora do Rosário a pé. “Ele vinha rezando um rosário pelo caminho e misturava-se entre nós, como mais um”, conta o padre Guillermo Torres, trazido para a favela pelo próprio Bergoglio, 14 anos atrás.

SEM VOLTA

Mesmo com a designação do novo papa, a 30 metros de distância, na Igreja Universal, Yanina Arriola, 23, diz que não volta à Igreja Católica -na qual era praticante até cinco anos atrás.

“Eu me sentia vazia espiritualmente. Vivia triste, com baixa autoestima. Comecei a sair com rapazes que se drogavam. Um dia tomei a decisão de mudar tudo na minha vida. Vim a um grupo de jovens da Universal e comecei a crer em mim mesma, a ter autoestima, a estar alegre, bem comigo mesma”, afirma.

Na Villa 31 vivem 40 mil pessoas, com forte presença de paraguaios, bolivianos e peruanos, além de excluídos das províncias argentinas.

Brian Córdoba, 19, chegou do Peru com 14 anos, período em que também deixou a Igreja Católica. “No catolicismo veneram imagens de gesso ou de madeira, enquanto aqui há um Deus vivo”, diz.

Mas a 30 metros da Universal, na capela Nossa Senhora do Rosário, Jesus Mauricio Carides, um seminarista de 18 anos que conheceu Bergoglio quando morava em outra favela de Buenos Aires, a Bajo Flores, vê em Francisco a certeza de sua fé.

“Comecei o seminário na mesma quarta em que ele foi nomeado papa. Para mim foi um sinal. Assim como eu, muitos vão seguir o seu exemplo”, confia.

Portal Padom / Folha

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