Pastor casamenteiro se compara a Santo Antônio e admira Chico Xavier

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Durante mais de 40 anos, o pastor presbiteriano Jonas Rezende construiu com delicadeza e sensibilidade a reputação que o tornou um dos profissionais mais requisitados no mercado de cerimônias de casamento da capital fluminense.

Hoje trabalhando com a “Celebrantes”, primeira agência do ramo no Brasil, Jonas Rezende tenta equilibrar a agenda, que só não está lotada por vontade própria. “Estou colocando o pé no freio por cansaço e por ter uma autocrítica”, diz com humildade o pastor, ainda o favorito das noivas cariocas.

O pastor Renato Gonçalves, dono da agência, diz que Jonas mudou a forma como se faziam casamentos no Rio de Janeiro há 30 anos. “Era o jeito protestante e o jeito católico. O Jonas começou a trazer elementos novos com informalidade. Citava MPB, poesia. Ele rompeu o espaço do sagrado e ficou conhecido por muitos anos como o pastor dos judeus por realizar casamentos de famílias judaicas. Conseguiu unir elementos de tradições muito diferentes, mas harmonizando”, conta o empresário.

“Fiquei muito casamenteiro, mas também fiz muitos batismos, 15 anos. O casamento ficou mais forte. Sou quase um Santo Antônio”, brinca Jonas, que está com 77 anos. “Gostei muito de conhecer o Renato, achei que tinha bons interesses, vontade de fazer uma coisa nova. Isso (a agência) não significa um bombardeio à fé por ser comercial”, diz Jonas.

“Todo grande celebrante do Rio de Janeiro tem o Jonas como referência porque ele é a história viva das celebrações na capital carioca e faz isso como ninguém”, afirma Renato.

LP de “Vale Tudo” na prateleira

O segredo do pastor, também conhecido por ser pai da atriz Lídia Brondi e pelos inúmeros programas de que participou na TV Educativa, ultrapassa as palavras e transparece através de gestos. Para esta entrevista, ele fez questão de receber a reportagem do iG em sua casa, leu poesias e convidou a equipe para um almoço em clima fraterno. Como quem recebe um amigo.

Na prateleira da sala de estar o disco de “Vale Tudo” (1988) – novela estrelada pela filha ao lado do ator Cássio Gabus Mendes – , exemplares dos 28 livros que publicou e a foto de um cachorro com versos em destaque chamam a atenção.

“O cachorro era do pastor Mozart. Ele me convidou para fazer o sepultamento dele. Terminei dizendo uma poesia antiga: ‘Pela estrada da vida subi morros e desci ladeiras, e no final te digo, que se entre amigos encontrei cachorros, entre cachorros encontrei-te amigo’”, lembra o pastor com um sorriso.

Jonas afirma que não tem ideia de quantos casamentos realizou. “Não tenho uma estatística. Mas também não me interesso muito por números. Com certeza foram muitos”, diz ele, que está casado pela quarta vez e é pai de seis filhos.

O pastor atribui o crescimento do número de cerimônias que celebrou ao fato da igreja católica proibir casamentos fora da igreja. “Muitos noivos preferem já fazer a celebração e a festa no mesmo lugar”, diz.

Sobre o talento para traduzir o sentimento dos noivos em palavras, explica que evita roteiros. “Sempre tive uma facilidade de não repetir aqueles manuais, coisas escritas, porque eu não leio durante o casamento. Só se for uma coisa muito importante que me peçam para fazer”, conta Jonas, que fala o que lhe ocorre, respeitando as linhas da Igreja Presbiteriana.

“Casamento não é cerimônia”

Jonas prefere que seus sermões sejam chamados de mensagens e não usa mais de 30 minutos numa cerimônia. “Eu não uso meia hora. Meia hora seria toda a celebração. A mensagem fica no máximo em 15 minutos. Mas sabe, a gente não tem que falar de tudo, temos que mostrar avenidas e não estradinhas vicinais. Temos que mostrar direções”.

E dá a dica: “Casamento não é cerimônia. É um entrelaçamento de pessoas diferentes. É um aprendizado a vida inteira. Companheirismo, respeito e amor têm que vir à tona sempre”.

Jonas é conhecido por ser pioneiro nas celebrações ecumênicas e, por isso, é querido especialmente dentro da comunidade judaica. “Com os judeus eu fazia o possível para ser elástico. Punha uma túnica sem identificação de fé, de nada, não falava nomes cristãos para não embaraçar e, como a Bíblia tem o velho testamento, que é comum aos judeus, usava esses textos”, conta Jonas, que não chegou a fazer celebrações com cultos afro e, hoje, gostaria de ter dado mais atenção ao espiritismo.

Pastor ecumênico

“Não cheguei a fazer não por preconceito. Mas não era a minha praia. Hoje em dia o espiritismo é muito respeitado, tem uma palavra que deve ser ouvida”, afirma o pastor, que não poupa elogios a Chico Xavier. “Depois dos filmes sobre Chico Xavier o povo tomou consciência de que aquilo não era uma brincadeira. Era uma pessoa séria, com uma folha de serviços enorme e com algumas demonstrações de desenvoltura em certos setores que o sacerdote comum não tem penetração”, pondera Jonas, que mostra sua mente aberta a todas as crenças.

A experiência eclética na vida profissional não se restringe apenas aos gêneros de cerimônias que celebrou. Jonas já foi vice-diretor geral do DESIP, antigo órgão responsável pelo sistema penitenciário e carcerário no Estado do Rio de Janeiro até 2003.

“Lembro de uma vez em que o diretor estava fora e, pela hierarquia, fiquei no comando. Houve um motim na Frei Caneca (complexo penitenciário no Rio de Janeiro que foi implodido em 2010). Eu estava fazendo um casamento e os agentes me esperaram com um furgão até eu terminar”, conta ele.

Casamento X carnaval

A flexibilidade já lhe rendeu episódios inusitados. “Me pediram para fazer um casamento num carro alegórico, durante o desfile de uma escola de samba do grupo especial no carnaval do Rio. Me sensibilizei com o pedido, mas tive que declinar pois achei que ninguém iria prestar atenção”, diz ele, que em tantos anos de celebração já chegou a acudir um noivo que desmaiou de nervoso. “As mulheres, ao contrário do que se pensa, são sempre as mais tranquilas. Tive que segurar o tal noivo pela lapela”, conta, com um sorriso.

Questionado sobre qual foi a cerimônia que mais lhe emocionou, entrega: “Minha emoção maior foi quando casei um filho meu adotivo, Laercio. Era muito companheiro e eu vi que ele ia sair de casa e tal. Quase não consegui fazer”.

Para as próximas gerações de celebrantes, Jonas deixa uma dica: não ser dogmático. “Isso não significa não ter princípios. É não ter a pretensão de ser o dono da verdade, respeitar os que são de um lado diferente porque eles também estão lutando como nós pela implantação de um mundo melhor e mais coerente para os nossos filhos”.

 

Delas Ig / Portal Padom

 

 

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