Mulher conta trajetória em meio a drogas e diz que “Sem Deus não vamos a lugar nenhum, é Ele que está me mantendo no caminho certo”

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Uso ou tráfico de entorpecentes é pano de fundo de metade dos homicídios na Grande Cuiabá. Ex-usuária chegou a traficar, mas saiu dessa
Ela já viveu nas ruas como mendiga, traficou drogas quando ainda era adolescente, esteve presa por duas vezes, comandou um grupo que aterrorizava a cidade e abandonou três filhos. Ela é Luciene Justina Braga, tem 36 anos, é pouco conhecida em Cuiabá, mas muito temida em Rondonópolis (250 quilômetros da Capital), cidade onde morava até o início de 2010.
Durante 25 anos, a vida de Luciene esteve diretamente ligada às drogas. Depois de chegar ao fundo do poço, ao ponto de trocar a roupa do corpo por drogas, desejar a própria morte e perder o respeito e a confiança da família, Luciene ressurge recuperada, vivendo uma nova vida.
Morando atualmente em Cuiabá, onde trabalha como empregada doméstica, ela contou que era karateca, até recebeu a faixa roxa e treinou outras garotas e garotos. Também jogou futebol por um período, trabalhou na construção civil como pedreira, mas as drogas a impediram de continuar na lida.
Ao fazer uma reflexão, Luciene lembrou que começou usando maconha aos 11 anos. Depois, queria algo mais forte, então passou a consumir a pasta-base, depois o crack. “Vivi as piores experiências que uma pessoa pode passar. Além disso, fiz minha família sofrer muito”, lamenta. Aos 17 anos, saiu de casa para ir a uma festa deixando o filhinho de apenas oitos meses com a avó e desapareceu por um ano e meio.
Nesse período, a mãe de Luciene, dona Analice Justina Borges, e o padrasto, João Marques Oliveira, cuidaram do filho dela. Anos depois do retorno, engravidou novamente e, mais uma vez, dona Analice “adotou” o bebê, dessa vez uma menina, para não vê-la passando por privações e sofrendo em meio às loucuras da mãe dependente química.
Luciene diz que se casou quatro vezes, na segunda união, mesmo quando tinha uma vida estável emocional e financeiramente, não conseguia abandonar as drogas. O máximo que fazia era diminuir a quantidade consumida diariamente. Quando tudo parecia bem, Luciene adotava decisões assustadoras, como o dia em que vendeu um moto do marido para ter mais drogas em casa.
A terceira filha, fruto do terceiro casamento, também não vive com ela. Está como seu ex-marido. Luciene garante que nunca matou ou roubou, mas chegou a levar drogas para a Bahia. Também só andava armada pelas ruas de Rondonópolis e comandava um grupo que intimidava as pessoas e fazia muita bagunça.
“Acho que todos conhecem a Mirei (como era chamada no passado) que vivia pelas ruas e aprontava muito em Rondonópolis, mas poucos, na verdade ninguém, conhece a Luciene de hoje, a mulher que se libertou das drogas e vive uma nova vida”, diz.

Ajuda começou em um hospital psiquiátrico para ficar ‘limpa’
Há um ano sem usar drogas, Luciene Braga conta que nunca havia ficado tanto tempo “limpa”. Isso só foi possível, diz, porque ela mesma decidiu que não queria mais viver em sofrimento e pediu ajuda para ser internada em um hospital psiquiátrico da cidade, onde passou menos de um mês. Quando deixou o manicômio recorreu ao Lar Cristão, uma instituição religiosa de Cuiabá cujo diretor, pastor Teodorico Barbosa de Sousa, estava de passagem por Rondonópolis.
Na Capital, poucos dias depois da internação começou a trabalhar como doméstica na casa da família do pastor Teodorico. Além de não pagar pelo tratamento, ainda recebia R$ 300, dinheiro com o qual se mantinha.
Ao concluir o tratamento, recebeu abrigo de uma cooperadora do Lar Cristão até conseguir um emprego e alugar a casa onde mora. Para ela, acreditar em si mesmo e aceitar o amor de Deus, por meio de uma religião, fez e continua fazendo a diferença em sua vida. “Sem Deus não vamos a lugar nenhum, é Ele que está me mantendo no caminho certo”, diz.
Atualmente, Luciene mora no bairro CPA IV, onde é vizinha da manicure Ednalva Maria Campos, outra ex-dependente química que chegou a perder a guarda dos filhos por causa do uso de drogas. Ambas estão levando uma vida comum, trabalhando e tentando superar as dificuldades cotidianas como tantos outros cidadãos brasileiros, sem o subterfúgio dos entorpecentes.
Luciene, que ainda não reencontrou a família, planeja retornar em breve a Rondonópolis, mas não para morar. Ela acha que é a prova viva de que o dependente químico pode se recuperar e lutar, dia após dias, para não voltar ao uso de drogas.

Diário de Cuiaba / www.padom.com.br

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